BEM-VINDO, MAIS UMA VEZ, à bela família Sinclair.
Acreditamos em exercícios ao ar livre. Acreditamos que o tempo cura.
Acreditamos, embora não digamos de maneira tão explícita, em remédios controlados e
drinques antes do jantar.
Não discutimos nossos problemas em restaurantes. Não acreditamos em demonstrações
públicas de angústia. Nosso lábio superior é rígido e é possível que as pessoas fiquem
curiosas a nosso respeito porque não abrimos nosso coração.
É possível que apreciemos o modo como as pessoas ficam curiosas a nosso respeito.
Aqui em Burlington agora somos só eu, minha mãe e os cães. Não temos o peso do meu avô
em Boston nem o impacto de toda a família em Beechwood, mas ainda assim sei como as
pessoas nos veem. Minha mãe e eu somos praticamente iguais, na casa grande com varanda no
alto da colina. A mãe esbelta e a filha doente. Temos maçãs do rosto protuberantes, ombros
largos. Sorrimos e mostramos os dentes quando vamos à cidade.
A filha doente não fala muito. As pessoas que a conhecem da escola tendem a se manter
afastadas. Não a conheciam direito antes de ficar doente mesmo. Ela já era quieta.
Agora, falta à escola na metade do tempo. Quando está lá, sua pele pálida e os olhos
úmidos tornam seu visual encantadoramente trágico, como uma heroína da literatura
definhando com tuberculose. Às vezes ela cai na escola, chorando. Assusta os outros alunos.
Mesmo os mais gentis já estão cansados de levá-la até a enfermaria.
Ainda assim, tem uma aura de mistério que a impede de ser importunada ou escolhida como
alvo de brincadeiras desagradáveis típicas do colégio. Sua mãe é uma Sinclair.
Naturalmente, não sinto meu próprio mistério ao comer uma lata de sopa tarde da noite ou
ao ficar deitada sob a luz fluorescente da enfermaria da escola. Não é nada glamoroso como
eu e minha mãe brigamos desde que meu pai se foi.
Eu acordo e a encontro parada na porta do meu quarto, observando.
— Não fique me olhando.
— Eu te amo. Estou cuidando de você — ela diz com a mão no coração.
— Bem, pare com isso.
Se eu pudesse fechar a porta na cara dela, faria isso. Mas não consigo levantar.
Com frequência, encontro anotações que parecem registrar os alimentos que ingeri em
determinado dia: meia torrada com geleia; maçã e pipoca; salada com passas; chocolate;
macarrão. Hidratação? Proteína? Muito refrigerante.
Não é glamoroso não poder dirigir. Não é misterioso ficar em casa em pleno sábado à
noite, lendo um romance com um amontoado de cachorros. No entanto, não estou imune à
sensação de ser vista como um mistério, como uma Sinclair, como parte de um clã
privilegiado de pessoas especiais, e como parte de uma narrativa mágica, importante, apenas
por fazer parte desse clã.
Minha mãe também não está imune a isso.
Foi para isso que fomos criadas.
Sinclair. Sinclair
0 comentários:
Postar um comentário