terça-feira, 28 de abril de 2015

19



MEU PAI PRETENDE ME LEVAR para a Austrália e para a Nova Zelândia durante todo o verão dos
dezessete.
Não quero ir.
Quero voltar para Beechwood. Quero ver Mirren e deitar no sol, planejando nosso futuro.
Quero brigar com Johnny, ir mergulhar e fazer sorvete. Quero acender fogueiras na praia
pequena. Quero que a gente se empilhe na rede da varanda de Clairmont e volte a ser os
Mentirosos, se possível.
Quero me lembrar do acidente.
Quero saber por que Gat desapareceu. Não sei por que ele não estava nadando comigo. Não
sei por que fui até a praia pequena sozinha. Por que nadei de calcinha e sutiã e não deixei
nenhuma roupa na areia. E por que ele foi embora quando me machuquei.
Fico imaginando se ele me amava. Se amava Raquel.
Meu pai e eu vamos viajar para a Austrália em cinco dias.
Eu não devia ter concordado.
Fico lamentando, chorando. Digo à minha mãe que não preciso ver o mundo. Preciso ver
minha família. Estou com saudade do meu avô.
Não.
Vou ficar doente se viajar para a Austrália. Minha cabeça vai explodir, eu não devia entrar
no avião. Não devia comer nada estranho. Não devia sofrer com jet lag. E se perdermos meus
medicamentos?
Pare de discutir. A viagem já está paga.
Saio para passear com os cachorros de manhã. Coloco a louça na máquina e depois guardo.
Coloco um vestido e passo blush no rosto. Como tudo o que está no prato. Deixo minha mãe
me envolver com os braços e acariciar meu cabelo. Digo que quero passar o verão com ela,
não com meu pai.
Por favor.
No dia seguinte, meu avô vem a Burlington e fica no quarto de hóspedes. Estava na ilha
desde meados de maio e teve que pegar um barco, um carro e um avião para vir até aqui. Ele
não vinha nos visitar desde antes de minha avó Tipper morrer.
Minha mãe vai buscá-lo no aeroporto. Eu fico em casa e arrumo a mesa para o jantar. Ela
comprou frango assado e acompanhamentos em uma rotisseria no centro.
Meu avô emagreceu desde a última vez que o vi. O cabelo branco sobressai como nuvens
ao redor das orelhas; tufos. Ele parece um passarinho. Sua pele está solta ao redor de sua
figura e ele está encurvado e barrigudo, diferente de como eu me lembrava dele. Sempre
pareceu invencível, com ombros firmes e largos e muitos dentes.
Meu avô é do tipo de pessoa que tem lemas. “Não aceite não como resposta”, ele sempre
nos dizia. E “Nunca sente nos fundos da sala. Vencedores sentam na frente”.
Nós, os Mentirosos, costumávamos revirar os olhos quando ele fazia essas declarações —
“Seja resoluto, ninguém gosta de gente evasiva”; “Nunca reclame, nunca explique” —, mas
ainda o víamos como alguém cheio de sabedoria em assuntos dos adultos.
Meu avô está de bermuda xadrez e mocassim. Suas pernas são pernas finas de velho. Ele dá
um tapinha nas minhas costas e pede um uísque com refrigerante.
Comemos e ele fala sobre alguns de seus amigos de Boston. A nova cozinha de sua casa em
Beechwood. Nada importante. Depois, minha mãe arruma tudo enquanto mostro a ele o jardim
dos fundos. O sol de fim de tarde ainda está lá.
Meu avô pega uma peônia e a entrega a mim.
— Para minha primeira neta.
— Não arranque as flores, está bem?
— Penny não vai se importar.
— Vai, sim.
— Cadence foi a primeira — ele diz, olhando para o céu, não em meus olhos. — Eu me
lembro de quando foi nos visitar em Boston. Vestia um macacão cor-de-rosa e seu cabelo
estava arrepiado. Johnny só nasceu três semanas depois.
— Eu estou bem aqui, vô.
— Cadence foi a primeira e não importava que fosse menina. Eu lhe daria tudo. Assim
como a um neto homem. Eu a peguei nos braços e dancei. Ela era o futuro da família.
Aceno com a cabeça.
— Dava para ver que ela era uma Sinclair. Tinha aquele cabelo, mas não era só isso. Era o
queixo, as mãozinhas. Sabíamos que seria alta. Todos éramos altos até Bess se casar com
aquele sujeito baixinho e Carrie cometer o mesmo erro.
— Você quer dizer Brody e William.
— Que bom que nos livramos deles, não é? — Meu avô sorri. — Todo o nosso pessoal era
alto. Você sabia que o lado da minha mãe veio no Mayflower? Para fazer a vida nos Estados
Unidos.
Sei que não é importante nossa família ter vindo no Mayflower. Não é importante ser alto.
Ou loiro. Foi por isso que tingi o cabelo. Não quero ser a mais velha. Herdeira da ilha, da
fortuna e das expectativas.
Mas, também, talvez eu queira.
Meu avô bebeu demais depois de um longo dia de viagem.
— Vamos entrar? — perguntei. — Quer se sentar?
Ele pega uma segunda peônia e a entrega a mim.
— Perdão, minha querida.
Dou um tapinha em suas costas arqueadas.
— Não arranque mais nenhuma, está bem?
Meu avô se abaixa e toca em algumas tulipas brancas.
— Sério, não faça isso — eu digo.
Ele pega uma terceira peônia, de forma abrupta, provocativa. Entrega-a para mim.
— Você é minha Cadence. A primeira.
— Sim.
— O que aconteceu com seu cabelo?
— Eu pintei.
— Nem te reconheci.
— Não faz mal.
Meu avô aponta para as peônias, agora todas na minha mão.
— Três flores para você. Você devia ter três.
Ele parece patético. Parece poderoso.
Eu o amo, mas não sei ao certo se gosto dele. Pego em sua mão e o levo para dentro
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Bem Vindos ao Livro teen


Então resolvi criar esse blog porque, muita gente não tem dinheiro(tipo eu) ,vou postar livro de qualquer estilo,porque eu qualquer estilos amo ler,quer um livro que eu poste basta pedir na embaixo no meu ask,ok meu nome João Paulo ,comente para eu interagir com vocês.

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