terça-feira, 5 de maio de 2015

Capítulo 5



Eles acabaram voltando à Sede – que foi como Chuck chamou a construção torta de madeira com janelas – e chegaram a uma sombra escura entre o edifício e o muro de pedra atrás dele.
— Aonde estamos indo? — quis saber Thomas, ainda sobrecarregado com a visão dos muros se fechando, pensando no labirinto, na confusão, no medo. Disse a si mesmo para parar ou acabaria ficando louco. Tentando manter uma aparência de normalidade, ele fez uma fraca tentativa de dizer algo espirituoso. — Se está esperando por um beijo de boa noite, pode esquecer.
Chuck não se fez de rogado.
— Apenas cale a boca e fique perto de mim.
Thomas soltou um grande suspiro e deu de ombros antes de acompanhar o garoto mais novo no caminho de volta ao edifício. Andaram na ponta dos pés até chegar a uma janelinha empoeirada, com um pequeno feixe de luz se projetando através dela sobre a pedra e a hera.
Thomas ouviu alguém andar lá dentro.
— O banheiro — Chuck sussurrou.
— E daí? — um fio de nervosismo insinuou-se através da pele de Thomas.
— Adoro fazer isso com os outros. Me dá um grande prazer antes de ir dormir.
— Fazer o quê? — Algo dizia a Thomas que Chuck iria aprontar alguma. — Talvez eu devesse...
— Cale a boca e observe. — Chuck subiu em silêncio numa grande caixa de madeira que estava bem embaixo da janela. Agachou-se de modo que a sua cabeça ficasse posicionada bem abaixo de onde a pessoa que estava dentro pudesse vê-la. Então estendeu a mão e bateu de leve no vidro.
— Que besteira — sussurrou Thomas. Não poderia haver momento pior para pregar uma peça; podia ser Newt ou Alby lá dentro. — Não quero me meter em mais problemas... Acabo de chegar!
Chuck sufocou uma risada colocando a mão na boca. Ignorando Thomas, estendeu a mão e bateu na janela de novo.
Uma sombra cruzou a luz; então a janela se abriu. Thomas escondeu-se num pulo, espremendo-se o máximo que pôde de encontro aos fundos do edifício. Não podia acreditar que tinha se metido naquela história de pregar uma peça em alguém. O ângulo de visão da janela protegeu-o por um instante, mas Thomas sabia que ele e Chuck seriam vistos se quem quer que estivesse ali dentro pusesse a cabeça para fora a fim de observar melhor.
— Quem está aí? — gritou o garoto de dentro do banheiro, a voz áspera e carregada de raiva.
Thomas prendeu a respiração na hora quando percebeu que era Gally; ele já conhecia aquela voz.
Sem avisar, Chuck levantou a cabeça na direção da janela e gritou com todas as forças.
Um grande estardalhaço lá dentro indicou que a brincadeira funcionara – e a ladainha de xingamentos que se ouviu em seguida mostrava que Gally não estava nada satisfeito com aquilo. Thomas ficou tomado de um misto de horror e embaraço.
— Eu mato você, cara de mértila! — gritava Gally, mas Chuck já saltara da caixa e corria para o meio da Clareira. Thomas congelou quando ouviu Gally abrir a porta e sair correndo do banheiro.
Thomas finalmente saiu do seu transe e foi atrás do seu novo – e único – amigo. Mal acabara de dobrar a esquina quando Gally irrompeu gritando da Sede, com uma aparência de animal feroz desembestado.
Ele apontou para Thomas.
— Venha cá! — gritou.
O coração de Thomas se apertou, rendendo-se. Tudo parecia indicar que receberia um murro na cara.
— Não fui eu, eu juro — disse, mas naquele momento mediu o garoto de cima a baixo e chegou à conclusão de que pensando bem ele não era tão aterrorizante. Gally não era assim tão grande. Seria capaz de enfrentá-lo se fosse preciso.
— Não foi você? — rosnou Gally. Ele aproximou-se de Thomas devagar e parou bem na frente dele. — Então como sabe de algo que diz que não fez?
Thomas não disse nada. Estava constrangido, mas não tão assustado quanto alguns momentos antes.
— Não sou trouxa, Fedelho — bradou Gally. — Vi a cara gorda do Chuck pela janela. — Ele apontou de novo, dessa vez para o peito de Thomas. — Mas é melhor você decidir depressa quem vai querer como amigo ou inimigo, ouviu? Mais uma brincadeira dessas... não me interessa se foi uma ideia de maricas sua ou não... o sangue vai jorrar. Entendeu bem, Calouro? — Mas antes que Thomas pudesse responder, Gally já tinha dado meia-volta e se afastado.
Thomas só queria que aquele episódio acabasse.
— Sinto muito — murmurou, fazendo uma careta ao perceber como soava ridícula a resposta.
— Eu conheço você — acrescentou Gally sem olhar para trás. — Eu o vi na Transformação e vou descobrir quem você é.
Thomas observou enquanto o valentão desaparecia dentro da Sede. Não se lembrava de muita coisa, mas algo lhe dizia que nunca detestara tanto uma pessoa. Estava surpreso de ver quanto de fato odiava o garoto. Ele realmente, realmente o odiava. Voltou-se para ver Chuck parado, olhando para o chão, envergonhado.
— Muito obrigado, amigão — disse Thomas.
— Sinto muito... Se soubesse que era o Gally, nunca teria feito aquilo, eu juro.
Surpreendendo a si mesmo, Thomas deu uma risada. Uma hora antes, pensava que nunca mais ouviria um som daqueles sair de novo da sua boca.
Chuck observou bem Thomas e aos poucos foi esboçando um sorriso maroto.
— Confio assim?
Thomas abanou a cabeça.
— Não se desculpe. O... trolho bem que merecia, e olha que eu nem sei o que quer dizer trolho. Aquilo foi chocante. — Ele se sentia muito melhor.


Umas duas horas mais tarde, Thomas estava deitado em um macio saco de dormir ao lado de Chuck sobre um leito de relva perto dos jardins. Era um gramado extenso que não tinha notado antes, e muitos do grupo escolhiam o lugar para dormir. Thomas achou estranho, mas, pelo que pôde observar, não havia espaço suficiente dentro da Sede. Pelo menos não estava fazendo frio. O que o fez se perguntar pela milionésima vez onde eles estavam. Cansara de tentar se lembrar de nomes de lugares, ou de países ou governantes, como o mundo se organizava. E nenhum dos garotos da Clareira parecia ter uma ideia a respeito – e se tinham, não revelavam.
Ficou ali deitado em silêncio pelo maior tempo possível, contemplando as estrelas e ouvindo os murmúrios abafados de várias conversas mantidas ao longo da Clareira. A possibilidade de dormir parecia estar a quilômetros de distância, e ele não conseguia se livrar do desespero e do desamparo que tomara conta do seu corpo e da sua mente – a diversão temporária da peça que Chuck pregara em Gally havia muito se desvanecera. Aquele era um dia interminável – e estranho.
Era apenas... esquisito. Lembrava-se de uma porção de detalhes sobre a vida – comida, roupas, estudo, jogos, imagens diversas da aparência do mundo. Mas qualquer detalhe que pudesse se encaixar numa imagem para compor uma lembrança de verdade e acabada tinha de alguma forma se apagado. Era como olhar para uma imagem através de uma camada de água suja. Mais do que qualquer outra coisa, talvez, ele se sentia... triste.
Chuck interrompeu os seus pensamentos.
— Bem, Fedelho, você sobreviveu ao Primeiro Dia.
— Por pouco. — “Agora não, Chuck”, teve vontade de dizer. “Não estou a fim.”
Chuck levantou-se, apoiando-se num dos cotovelos, para observar Thomas.
— Você vai aprender uma porção de coisas nos próximos dias, vai começar a se acostumar com tudo. Bom isso, né?
— Hã, sim, bom isso. De onde vêm todas essas palavras e expressões estranhas, afinal de contas? — Parecia que tinham pegado um outro idioma e incorporado ao deles.
Chuck jogou-se de costas com um ruído oco.
— Sei lá... Faz só um mês que estou aqui, lembra?
Thomas ficou pensando em Chuck, se ele sabia mais do que demonstrava. Era um garoto sensível, divertido, e parecia inocente, mas quem sabe? Na verdade, ele era tão misterioso quanto tudo mais na Clareira.
Passaram-se alguns minutos, e Thomas sentiu que o longo dia finalmente o cansara, o sono começando a pesar na sua mente. Mas... como se um punho batesse de raspão no seu cérebro e sumisse... um pensamento passou-lhe de repente pela cabeça. Um pensamento inesperado e que ele não sabia de onde vinha. Num instante, a Clareira, os muros, o Labirinto – tudo aquilo parecia... familiar. Confortável. Uma onda de tranquilidade espalhou-se pelo seu peito e, pela primeira vez desde que se encontrava ali, não sentiu como se a Clareira fosse o pior lugar do universo. Ele se acalmou, sentiu os olhos bem abertos, a respiração contida por um longo momento. “O que acaba de acontecer?”, pensou. “O que mudou?” Ironicamente, a sensação de que tudo acabaria bem deixou-o um tanto incomodado.
Sem entender muito bem como, ele sabia o que precisava fazer. A descoberta era estranha e familiar ao mesmo tempo. Mas parecia tão... correta.
— Quero ser um daqueles caras que vão para lá — disse em voz alta, sem saber que Chuck ainda estava acordado. — Para dentro do Labirinto.
— Hã? — foi a resposta de Chuck. Thomas percebeu um toque de irritação na voz dele.
— Os Corredores — falou Thomas, desejando saber de onde vinha aquilo. — Seja o que for que eles fazem lá, eu quero fazer também.
— Você nem tem ideia do que está falando — resmungou Chuck, e virou de lado. — Vá dormir.
Thomas sentiu um novo ímpeto de confiança, muito embora na verdade não soubesse do que estava falando.
— Quero ser um Corredor.
Chuck voltou-se e apoiou-se no cotovelo.
— Pode esquecer essa ideia agora mesmo.
Thomas admirou-se com a reação de Chuck, mas insistiu.
— Não tente me...
— Thomas. Calouro. Meu novo amigo. Esqueça.
— Vou falar com o Alby amanhã. — “Um Corredor”, pensou Thomas. “Nem mesmo sei o que isso significa. Será que perdi o juízo?”
Chuck deitou-se com uma risada.
— Você é mesmo um pedaço de plong. Vá dormir.
Mas Thomas não conseguia parar.
— Tem alguma coisa lá fora... me soa familiar.
— Vá... dor... mir.
Então Thomas percebeu... como se várias peças de um quebra-cabeça se encaixassem. Ele não sabia como seria a imagem no final, mas as palavras que disse em seguida quase soaram como se saíssem de outra pessoa.
— Chuck, eu... eu acho que já estive aqui antes.
Ele ouviu o amigo sentar-se, ouviu-o respirar fundo. Mas Thomas rolou para o lado e se recusou a dizer qualquer coisa, preocupado em não estragar aquela nova sensação de sentir-se encorajado, em não espantar a calma tranquilizadora que enchera o seu coração.
O sono veio mais fácil do que esperava.

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Então resolvi criar esse blog porque, muita gente não tem dinheiro(tipo eu) ,vou postar livro de qualquer estilo,porque eu qualquer estilos amo ler,quer um livro que eu poste basta pedir na embaixo no meu ask,ok meu nome João Paulo ,comente para eu interagir com vocês.

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