terça-feira, 28 de abril de 2015

23



EM WOODS HOLE, a cidade portuária, minha mãe e eu deixamos os cachorros saírem do carro e
arrastamos as malas até o cais, onde tia Carrie nos espera.
Ela dá um abraço demorado na minha mãe antes de nos ajudar a colocar as malas e os cães
no grande barco a motor.
— Você está mais linda do que nunca — tia Carrie diz. — E que bom que veio.
— Ah, fique quieta — diz minha mãe.
— Sei que andou doente — Carrie diz para mim. Ela é a mais alta das minhas tias, e a mais
velha. Seu suéter de caxemira é comprido. As rugas nas laterais da boca são profundas. Está
usando joias antigas de jade que pertenceram à minha avó.
— Não tem nada de errado comigo que oxicodona e uns goles de vodca não curem —
respondo.
Carrie ri, mas minha mãe se aproxima dela e diz:
— Ela não está tomando oxicodona. Está usando um medicamento que não causa
dependência, prescrito pelo médico.
Não é verdade. Os medicamentos que não causam dependência não funcionaram.
— Ela parece magra demais — diz Carrie.
— É por causa da vodca — eu digo. — Tira meu apetite.
— Ela não consegue comer muito quando está com dor — diz minha mãe. — Fica com
náusea.
— Bess fez aquela torta de mirtilo que você gosta — me diz tia Carrie. Ela dá outro abraço
na minha mãe.
— Vocês estão se abraçando tanto de uma hora para a outra — eu digo. — Nunca foram
assim.
Tia Carrie me abraça também. Seu cheiro é de um perfume cítrico caro. Eu não a via fazia
muito tempo.
A saída do porto é fria e lampejante. Eu sento na traseira do barco enquanto minha mãe fica
ao lado da tia Carrie atrás do timão. Encosto a mão na água. Ela espirra na manga do meu
casaco, ensopando a lona.
Logo verei Gat.
Gat, meu Gat, que não é meu Gat.
As casas. Os pequenos, as tias, os Mentirosos.
Ouvirei o som das gaivotas, comerei bolo invertido e torta e sorvete caseiro. Ouvirei o
pongue das bolas de tênis, o latido dos cachorros, o eco da minha respiração no snorkel.
Acenderemos fogueiras com cheiro de cinzas.
Ainda vou me sentir em casa?
Em pouco tempo, Beechwood está diante de nós. Seu contorno familiar se aproxima. A
primeira casa que vejo é Windemere com seus telhados pontiagudos. Aquele quarto do lado
direito é da minha mãe, com cortinas azul-claras. Minha janela dá para a parte interna da ilha.
Carrie vira o barco e consigo ver Cuddledown no ponto mais baixo do terreno, sua estrutura
gorducha e quadrada. Uma minúscula baía arenosa — a praia pequena — fica no fim de uma
longa escadaria de madeira.
A vista muda conforme damos a volta pelo leste da ilha. Não dá para ver Red Gate direito
entre as árvores, mas vislumbro o acabamento vermelho. Depois a praia maior, acessada por
meio de outra escadaria de madeira.
Clairmont fica no ponto mais alto, com vista para o mar em três direções. Estico o pescoço
para olhar para sua simpática torre — mas ela não está lá. As árvores que costumavam fazer
sombra no grande e íngreme pátio também se foram. No lugar da casa vitoriana de seis
quartos, varanda cercada e cozinha de fazenda, no lugar da casa em que meu avô passou todos
os verões desde sempre, vejo uma construção elegante e moderna sobre uma colina rochosa.
Há um jardim japonês de um lado, pedras expostas do outro. A casa é vidro e ferro. Fria.
Carrie desliga o motor, facilitando a conversa.
— Aquela é a nova Clairmont — ela diz.
— Era apenas um esqueleto ano passado. Nunca pensei que ele fosse ficar sem um gramado
— diz minha mãe.
— Espere até ver lá dentro. As paredes estão vazias e, quando chegamos aqui ontem, não
tinha nada na geladeira além de umas maçãs e um pedaço de Havarti.
— Desde quando ele gosta de Havarti? — pergunta minha mãe. — Nem é um bom queijo.
— Ele não sabe fazer compras. Ginny e Lucille, a nova cozinheira, só fazem o que ele
manda. Está comendo pão com queijo. Mas eu fiz uma lista enorme e elas foram ao mercado
de Edgartown. Agora temos o bastante para alguns dias.
Minha mãe tem um calafrio.
— Que bom que estamos aqui.
Olho para a casa nova enquanto elas conversam. Sabia que meu avô havia reformado a
casa, é claro. Ele e minha mãe conversaram sobre a nova cozinha quando foi nos visitar,
alguns dias antes. A geladeira e o freezer extra, a estufa e as prateleiras de temperos.
Não havia me dado conta de que ele tinha derrubado a casa. Que o gramado já era. E as
árvores, principalmente a velha e gigantesca acerácea com o balanço de pneu. Devia ter uns
cem anos.
Uma onda surge, azul-escura, saltando no mar como uma baleia. Forma um arco sobre mim.
Os músculos do meu pescoço se contraem, minha garganta fecha. Eu me curvo sob o peso
dela. O sangue corre para minha cabeça. Estou me afogando.
Tudo parece tão triste, tão insuportavelmente triste por um instante, pensar na adorável
acerácea com o balanço. Nunca dissemos à árvore o quanto a amávamos. Nunca lhe demos um
nome, nunca fizemos nada por ela. Podia ter vivido muito mais.
Estou com tanto, tanto frio.
— Cadence? — Minha mãe está debruçada sobre mim.
Encontro sua mão e a agarro.
— Aja como uma pessoa normal — ela sussurra. — Agora mesmo.
— O quê?
— Porque você é. Porque você pode ser.
Está bem. Está bem. Era apenas uma árvore.
Apenas uma árvore com um balanço de pneu de que eu gostava muito.
— Não faça escândalo — sussurra minha mãe. — Respire e endireite-se.
Faço o que ela pede assim que consigo, como sempre.
Tia Carrie nos distrai, falando empolgada.
— O novo jardim é agradável depois que você se acostuma com ele — diz. — Tem uma
área com assentos para os drinques. Taft e Will estão encontrando pedras especiais.
Ela vira o barco na direção da praia e de repente consigo ver meus Mentirosos esperando,
não no cais, mas junto à cerca de madeira desgastada que acompanha a costa.
Mirren está com os pés na metade de baixo da barreira, acenando com alegria, o cabelo
chicoteando ao vento.
Mirren. Ela é açúcar. Ela é curiosidade e chuva.
Johnny pula para cima e para baixo, de vez em quando virando uma estrela.
Johnny. Ele é estalo. Ele é iniciativa e sarcasmo.
Gat, meu Gat, era uma vez meu Gat — ele também saiu para me ver. Está afastado das ripas
da cerca, sobre a colina rochosa que agora leva a Clairmont. Está fingindo que é um
sinalizador, balançando os braços em padrões elaborados como se eu tivesse que entender
algum tipo de código secreto. Ele é contemplação e entusiasmo. Ambição e café forte.
Bem-vinda ao lar, eles estão dizendo. Bem-vinda ao lar.
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Bem Vindos ao Livro teen


Então resolvi criar esse blog porque, muita gente não tem dinheiro(tipo eu) ,vou postar livro de qualquer estilo,porque eu qualquer estilos amo ler,quer um livro que eu poste basta pedir na embaixo no meu ask,ok meu nome João Paulo ,comente para eu interagir com vocês.

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