OS MENTIROSOS NÃO VÃO AO CAIS quando chegamos, nem tia Bess e meu avô. Ali estão apenas
os pequenos: Will e Taft, Liberty e Bonnie.
Os meninos, ambos com dez anos, chutam um ao outro e brincam de luta. Taft vem correndo
e agarra meu braço. Eu o pego e giro. Fico surpresa com sua leveza, como se seu corpo
sardento fosse de um passarinho.
— Está se sentindo melhor? — pergunto.
— Tem picolé no freezer! — ele grita. — De três sabores diferentes!
— Estou falando sério, Taft. Você estava perturbado no telefone ontem à noite.
— Não estava.
— Estava, sim.
— Mirren leu uma história para mim. Depois eu dormi. Sem problemas.
Bagunço seu cabelo cor de mel.
— É só uma casa. Muitas casas parecem assustadoras à noite, mas de manhã voltam a ser
agradáveis.
— Nem estamos mais ficando em Cuddledown mesmo — Taft diz. — Mudamos para a nova
Clairmont, com o vovô.
— Ah, é?
— Temos que ficar comportados lá e não agir como idiotas. Já levamos nossas coisas. E
Will pegou três águas-vivas na praia maior e também um caranguejo morto. Você vai lá ver?
— É claro.
— Ele está com o caranguejo no bolso, mas as águas-vivas estão em um balde com água —
diz Taft, e depois sai correndo.
MINHA MÃE E EU caminhamos pela ilha até Windemere, uma curta distância pela passagem de
madeira. As gêmeas ajudam com as malas.
Meu avô e tia Bess estão na cozinha. Há flores do campo em vasos sobre a bancada, e Bess
esfrega a pia limpa com palha de aço enquanto meu avô lê o Martha’s Vineyard Times.
Bess é mais delicada que as irmãs, e mais loira, mas saiu do mesmo molde. Usa jeans
branco, uma blusa de algodão azul-marinho e diamantes. Ela tira as luvas de borracha, beija
minha mãe e me dá um abraço longo demais, apertado demais, como se estivesse tentando
abraçar uma mensagem profunda e secreta. Ela tem cheiro de água sanitária e vinho.
Meu avô levanta, mas não atravessa o cômodo até Bess terminar o abraço.
— Olá, Mirren — ele diz com jovialidade. — Bom ver você.
— Ele está fazendo isso toda hora — Carrie diz para mim e para minha mãe. — Chama
todo mundo de Mirren.
— Sei que ela não é Mirren — meu avô diz.
Os adultos ficam conversando e eu saio com as gêmeas. Elas estão esquisitas de Crocs e
vestidos de verão. Já devem ter quase catorze anos. Têm as pernas fortes de Mirren e os olhos
azuis, mas o rosto fino.
— Seu cabelo está preto — diz Bonnie. — Você parece uma vampira morta.
— Bonnie! — Liberty dá um tapa nela.
— Bom, é redundante, porque todos os vampiros estão mortos — diz Bonnie. — Mas eles
têm olheiras escuras e pele branca, como você.
— Seja legal com a Cady — Liberty sussurra. — Mamãe mandou.
— Estou sendo legal — diz Bonnie. — Muitos vampiros são bonitos. É um fato
comprovado.
— Eu disse que não queria que você ficasse falando sobre coisas mortas e assustadoras
durante o verão — afirma Liberty. — Já foi ruim o bastante ontem à noite. — Ela se vira para
mim. — Bonnie está obcecada com a morte. Fica lendo livros sobre isso o tempo todo e
depois não consegue dormir. É irritante, porque dormimos no mesmo quarto. — Liberty diz
tudo isso sem olhar nos meus olhos.
— Eu estava falando do cabelo da Cady — diz Bonnie.
— Mas não precisava falar que ela parece morta.
— Não faz mal — digo a Bonnie. — Na verdade, não me importo com o que você acha,
então está tudo bem
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