terça-feira, 28 de abril de 2015

31



DOAÇÕES: desenhos da infância, gravuras de botânica.
Pego meu cesto de roupa suja em Windemere e vou até Cuddledown. Mirren me encontra na
varanda, saltitando.
— É tão incrível estar na ilha! — ela diz. — Nem acredito que estou aqui de novo.
— Você esteve aqui no verão passado.
— Não foi a mesma coisa. Não foi o idílio de verão que costumávamos ter. A nova
Clairmont estava em obras. Todo mundo estava agindo de forma deprimente e eu fiquei te
esperando, mas você não veio.
— Eu te falei que estava indo para a Europa.
— Ah, eu sei.
— Escrevi várias vezes — digo. A frase sai em tom de reprovação.
— Odeio e-mail! — diz Mirren. — Li todos, mas não pode ficar brava comigo por não
responder. Parece lição de casa, ficar digitando e olhando para a tela idiota do telefone ou do
computador.
— Você recebeu a boneca que eu te mandei?
Mirren me abraça.
— Senti tanto sua falta. Você nem consegue imaginar.
— Eu te mandei aquela Barbie. Aquela de cabelo comprido pela qual costumávamos brigar.
— Princesa Caramelo?
— É.
— Eu era louca pela Princesa Caramelo.
— Você me bateu com ela uma vez.
— Você mereceu! — Mirren saltita alegremente. — Ela está em Windemere?
— O quê? Não. Eu te mandei pelo correio — digo. — Durante o inverno.
Mirren olha para mim com a testa franzida.
— Eu não recebi, Cadence.
— Alguém assinou o recebimento do pacote. O que sua mãe fez? Enfiou em um armário sem
abrir?
Estou brincando, mas Mirren faz um gesto de confirmação.
— Talvez. Ela é compulsiva. Tipo, lava as mãos várias vezes. E obriga Taft e as gêmeas a
fazer o mesmo. Limpa como se houvesse um lugar especial no céu para pessoas com o piso da
cozinha impecável. Ela também bebe muito.
— Minha mãe também.
Mirren concorda.
— Não suporto nem olhar.
— Perdi alguma coisa durante o jantar de ontem?
— Eu não fui. — Mirren segue para a passagem de madeira que vai de Cuddledown à praia
pequena. Eu vou atrás. — Falei que nesse verão não iria. Por que você não veio para cá?
— Estava me sentindo mal.
— Sabemos que você tem enxaqueca — diz Mirren. — As tias andaram falando.
Eu me contorço.
— Não sinta pena de mim, está bem? Nunca. Isso me dá arrepios.
— Você não tomou seus remédios ontem à noite?
— Eles me derrubaram.
Chegamos à praia pequena. Nós duas estamos descalças sobre a areia úmida. Mirren toca a
concha de um caranguejo morto há tempos.
Quero contar a ela que tenho problemas de memória, que tenho traumatismo
cranioencefálico. Quero perguntar tudo que aconteceu no verão dos quinze, obrigá-la a me
contar as histórias que minha mãe não quer contar, ou não sabe. Mas lá está Mirren, radiante.
Não quero que ela sinta ainda mais pena de mim.
Além disso, ainda estou zangada pelos e-mails que não respondeu — e pela perda daquela
Barbie idiota, embora não tenha certeza de que a culpa tenha sido dela.
— Johnny e Gat estão em Red Gate ou dormiram em Cuddledown? — pergunto.
— Cuddledown. Minha nossa, como eles são relaxados. É como morar com duendes.
— Obrigue os dois a voltar para Red Gate, então.
— De jeito nenhum. — Mirren ri. — E quanto a você, nada de Windemere, está bem? Vai
ficar com a gente?
Faço que não com a cabeça.
— Minha mãe não deixou. Pedi hoje de manhã.
— Como assim? Ela precisa deixar!
— Ela não sai do meu pé desde que fiquei doente.
— Mas já se passaram quase dois anos.
— É. Ela fica me olhando enquanto durmo. Além disso, me deu um sermão sobre passar um
tempo com vovô e com os pequenos. Tenho que me conectar com a família. Colocar um
sorriso no rosto.
— Quanta bobagem. — Mirren me mostra um punhado de pedrinhas roxas que coletou. —
Pegue.
— Não, obrigada. — Não quero nada de que não precise.
— Por favor, fique com elas — diz Mirren. — Eu lembro que você sempre procurava
pedras roxas quando éramos pequenas. — Ela estica a mão na minha direção, com a palma
para cima. — Quero compensar pela Princesa Caramelo. — Há lágrimas em seus olhos. — E
pelos e-mails — acrescenta. — Quero te dar alguma coisa, Cady.
— Então tudo bem — digo. Faço uma concha com as mãos e deixo Mirren despejar as
pedras. Guardo-as no bolso da frente do moletom.
— Eu te amo! — ela grita, depois se vira e grita para o mar. — Eu amo minha prima
Cadence Sinclair Eastman!
— Não está exagerando? — É Johnny, descendo os degraus com os pés descalços, vestindo
pijamas velhos de flanela com listras grossas. Está usando óculos escuros e protetor solar
branco no nariz, como um salva-vidas.
Mirren fecha a cara, mas apenas por um instante.
— Estou expressando meus sentimentos, Johnny. É assim que fazem os seres humanos que
vivem e respiram. Não sabia?
— Está bem, ser humano que vive e respira — ele diz, batendo de leve no ombro dela. —
Mas não precisa ser tão barulhenta a essa hora da manhã. Temos o verão inteiro pela frente.
Ela faz beicinho.
— Cady só vai ficar quatro semanas.
— Não posso brigar com vocês tão cedo — diz Johnny. — Ainda não tomei meu chá
arrogante. — Ele se abaixa e olha dentro do cesto de roupa suja que está aos meus pés. — O
que tem aí?
— Gravuras de botânica e uns desenhos antigos.
— Por quê?
Johnny senta sobre uma pedra e eu me acomodo ao lado dele.
— Estou doando minhas coisas — digo. — Desde setembro. Lembra que eu te mandei o
cachecol listrado?
— Ah, sim.
Falo sobre dar as coisas para pessoas que possam usá-las, encontrando o lar certo para
elas. Falo sobre caridade e sobre questionar o materialismo da minha mãe.
Quero que Johnny e Mirren me entendam. Não sou alguém digna de pena, com uma mente
instável e estranhas crises de dor. Estou assumindo o controle da minha vida. Vivo de acordo
com meus princípios. Tomo atitudes e faço sacrifícios.
— Você não quer, sei lá, ter coisas? — Johnny me pergunta.
— Como o quê?
— Ah, eu quero coisas o tempo todo — diz Johnny, abrindo bem os braços. — Um carro.
Jogos de videogame. Casacos de lã caros. Gosto de relógios, eles são tão retrô. Quero arte de
verdade para as paredes, obras de pessoas famosas que nunca poderia ter, nem em um milhão
de anos. Bolos elaborados que vejo na vitrine das confeitarias. Suéteres, cachecóis. Coisas de
lã com listras, em geral.
— Ou você poderia querer lindos desenhos que fez quando era criança — afirma Mirren,
ajoelhando ao lado do cesto de roupa suja. — Recordações. — Ela pega o desenho da minha
vó com os cachorros feito com lápis de cor. — Veja, essa é a Fatima e esse é Príncipe Philip.
— Você sabe a diferença?
— É claro. Fatima tinha o focinho gorducho e a cara mais larga.
— Minha nossa, Mirren. Você é tão sentimental — Johnny diz
Postagem mais recente Postagem mais antiga Página inicial

0 comentários:

Postar um comentário

Bem Vindos ao Livro teen


Então resolvi criar esse blog porque, muita gente não tem dinheiro(tipo eu) ,vou postar livro de qualquer estilo,porque eu qualquer estilos amo ler,quer um livro que eu poste basta pedir na embaixo no meu ask,ok meu nome João Paulo ,comente para eu interagir com vocês.

Total de visualizações

Seguidores

Livros populares

Search