VOU ALMOÇAR na nova Clairmont uma hora depois. Sei que minha mãe não vai tolerar minha
ausência depois de ter perdido o jantar da noite anterior. Meu avô me mostra a casa enquanto
a cozinheira prepara a comida e as tias reúnem os pequenos.
É um lugar elegante. Piso de madeira brilhante, janelas enormes, tudo em linhas retas. Os
corredores de Clairmont costumavam ser decorados do chão ao teto com fotografias de
família em banco e preto, pinturas de cachorros, estantes, e a coleção de cartuns da New
Yorker do meu avô. Os corredores da nova Clairmont são vidro de um lado e vazio do outro.
Meu avô abre as portas dos quatro quartos de hóspedes no andar de cima. Todos estão
mobiliados apenas com camas e cômodas baixas e largas. As janelas têm cortinas brancas que
deixam entrar um pouco de luz. Não há estampa nas colchas; são apenas em tons refinados de
azul ou marrom.
O quarto dos pequenos tem alguma vida. Taft tem jogos no chão, uma bola de futebol, livros
sobre bruxos e órfãos. Liberty e Bonnie trouxeram revistas e um tocador de MP3. Tem pilhas
dos livros de Bonnie sobre caçadores de fantasmas, médiuns e anjos perigosos. A cômoda está
lotada de maquiagem e frascos de perfume. Há raquetes de tênis no canto.
O quarto do meu avô é maior que os outros e tem a melhor vista. Ele me leva até lá e me
mostra o banheiro, cujo chuveiro tem barras de apoio. Barras para velhos, para ele não cair.
— Onde estão seus cartuns da New Yorker? — pergunto.
— O decorador tomou algumas decisões.
— E as almofadas?
— O quê?
— Vocês tinham aquelas almofadas. Com cães bordados.
Ele sacode a cabeça.
— Você ficou com o peixe?
— O quê? O peixe-espada e tudo aquilo? — Descemos a escadaria até o andar térreo. Meu
avô se movimenta com lentidão e eu ando atrás dele. — Comecei de novo com essa casa —
ele diz simplesmente. — A antiga vida se foi.
Ele abre a porta do escritório. Tem a mesma seriedade do resto da casa. Há um laptop no
meio da mesa. Uma janela grande dá para o jardim japonês. Uma cadeira. Uma parede com
prateleiras completamente vazias.
Parece sóbrio e aberto, mas não é modesto, porque tudo é opulento.
Meu avô é mais parecido com minha mãe do que comigo. Ele apagou a antiga vida gastando
dinheiro em outra para substituí-la.
— Onde está aquele jovem? — meu avô pergunta de repente. Seu rosto assume uma
expressão vaga.
— Johnny?
Ele sacode a cabeça.
— Não, não.
— Gat?
— Sim, aquele jovem. — Ele se segura na mesa por um instante, como se sentisse tontura.
— Você está bem?
— Ah, estou.
— Gat está em Cuddledown com Mirren e Johnny — digo a ele.
— Prometi um livro a ele.
— A maioria dos seus livros não está aqui.
— Pare de me dizer o que não está aqui! — meu avô grita com um vigor repentino.
— Você está bem? — pergunta tia Carrie da porta do escritório.
— Estou — ele diz.
Carrie me olha de um jeito estranho e pega no braço do meu avô.
— Vamos. O almoço está pronto.
— Você voltou a dormir? — pergunto a minha tia no caminho para a cozinha. — Ontem à
noite… Johnny estava acordado?
— Não sei do que está falando — ela diz
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