sábado, 15 de agosto de 2015

AMY ELLIOTT 8 DE JANEIRO DE 2005


ANOTAÇÃO EM DIÁRIO
Lá lá lá! Estou sorrindo um grande sorriso de órfão adotado enquanto escrevo isto. Tenho até
vergonha de estar tão feliz. Como um desenho em tecnicolor de uma adolescente falando ao
telefone com os cabelos presos em um rabo de cavalo, o balão em cima de minha cabeça
dizendo: Conheci um rapaz!
Mas foi mesmo. Essa é uma verdade técnica, empírica. Conheci um rapaz, um cara fantástico,
lindo, um sujeito divertido pacas. Vou descrever a cena, pois ela merece ficar para a posteridade
(não, por favor, não estou tão maluca, posteridade! Pff). Ainda assim. Não é a noite da virada,
mas ainda estamos bem no comecinho do novo ano. É inverno: escureceu cedo, o frio é
congelante.
Carmen, uma nova amiga — semiamiga, pouco amiga, o tipo de amiga com quem você não
desmarca —, me convenceu a ir ao Brooklyn, a uma das festas dos seus amigos escritores. Eu
gosto de uma boa festa de escritores, eu gosto de escritores, sou filha de escritores, sou escritora.
Ainda adoro rabiscar essa palavra — ESCRITORA — sempre que um formulário, questionário
ou documento pergunta qual é minha ocupação. Certo, eu escrevo testes de personalidade, não
escrevo sobre as Grandes Questões da Atualidade, mas acho justo dizer que sou escritora. Estou
usando este diário para melhorar: para refinar minhas habilidades, coletar detalhes e
observações. Para criar imagens e aquelas outras baboseiras de escritores. (Sorriso de órfão
adotado não é nada mau, vamos lá.) Mas na verdade eu acho mesmo que meus testes já me
classificam pelo menos a título honorário. Certo?
Em uma festa, você se encontra cercada por jornalistas genuinamente talentosos, que
trabalham em jornais e revistas respeitados e de alto nível. Você é uma mera redatora de
testes para revistas de fofoca. Quando alguém lhe pergunta o que faz da vida, você:
a) Fica constrangida e diz: “Escrevo testes, só, besteira!”
b) Parte para a ofensiva: “Agora sou escritora, mas estou pensando em algo mais desafiador e que valha mais a pena, por
quê? O que você faz?”
c) Orgulha-se de suas conquistas: “Escrevo testes de personalidade usando o conhecimento obtido em meu mestrado em
psicologia. Ah, e um fato curioso: sou a inspiração para uma adorada série de livros infantis, tenho certeza de que você
conhece. Amy Exemplar. É, engole essa, seu otário metido!”
Resposta: C, totalmente C.
Enfim, a festa é de um dos amigos próximos de Carmen, que escreve sobre filmes para uma
revista de cinema e que é muito engraçado, segundo Carmen. Por um segundo, temo que ela
queira nos juntar: não estou interessada em ser juntada a ninguém. Eu preciso ser emboscada,
pega distraída, como alguma espécie feroz de chacal do amor. Do contrário, fico constrangida
demais. Eu me flagro tentando ser charmosa, e então me dou conta de que é óbvio que estou
tentando ser charmosa, e então tento ser ainda mais charmosa para compensar o falso charme e aí
basicamente me transformo em Liza Minnelli: estou dançando de meia-calça e lantejoulas,
implorando para que você me ame. Há um chapéu-coco, gestos exagerados e muitos dentes.
Mas não, percebo, enquanto Carmen fala sem parar sobre seu amigo: ela gosta dele. Que
bom.
Subimos três lances de escadas em zigue-zague e entramos em uma agitação de calor humano
e literariedade: muitos óculos de armação preta e cabeleiras poderosas, falsas camisas de caubói
e blusas de gola alta multicoloridas; japonas de lã preta jogadas sobre todo o sofá, formando
pilhas no chão; um pôster alemão de Os implacáveis (Ihre Chance war gleich Null!) cobrindo
uma parede com a tinta descascando. Franz Ferdinand no aparelho de som: “Take Me Out”.
Meia dúzia de homens se amontoa em volta de uma mesa de jogo onde estão arrumadas as
bebidas, servindo seus copos novamente após alguns goles, muito conscientes do pouco que
resta. Eu me enfio no meio, apontando meu copo de plástico para o centro como quem pede
dinheiro, consigo uns cubos de gelo e um choro de vodca de um cara de rosto gentil vestindo uma
camiseta do Space Invaders.
Uma garrafa de licor de maçã verde de aparência letal, a oferta irônica do anfitrião, logo será
nosso destino, caso ninguém saia para comprar mais bebida, e isso parece improvável, já que
todos claramente acreditam que foram eles que fizeram isso da última vez. É definitivamente uma
festa de janeiro, todos ainda empanturrados e cheios de açúcar das festas de fim de ano, ao
mesmo tempo preguiçosos e irritadiços. Uma festa onde as pessoas bebem demais e se metem em
brigas com palavras inteligentes, soprando fumaça de cigarro por uma janela aberta, mesmo
depois de o anfitrião ter pedido que elas fossem para o lado de fora. Já conversamos uns com os
outros em mil festas de fim de ano, não temos mais nada a dizer, estamos coletivamente
entediados, mas não queremos voltar para o frio de janeiro; nossas pernas ainda doem de subir
os degraus do metrô.
Perdi Carmem para seu anfitrião galã — estão tendo uma conversa intensa em um canto da
cozinha, os dois com as costas arqueadas, os rostos voltados um para o outro na forma de um
coração. Que bom. Penso em comer, para ter algo a fazer além de ficar parada no meio da sala,
sorrindo como a aluna nova no refeitório. Mas já acabou quase tudo. Há alguns restos de batata
frita no fundo de um enorme pote plástico. Uma bandeja de supermercado cheia de cenouras
velhas, aipo amassado e um creme parecendo sêmen repousa intocada em uma mesinha de centro,
cigarros espalhados como pedaços extras de legume. Estou cuidando da minha vida, minha vida
impulsiva: e se eu pulasse da varanda neste exato momento? E se eu desse um beijo de língua no
sem-teto na minha frente no metrô? E se eu me sentasse sozinha no chão dessa festa e comesse
tudo naquela bandeja, incluindo os cigarros?
— Por favor, não coma nada dali — diz ele.
É ele (tã, tã, TÃÃÃ!), mas eu ainda não sei que é ele (tã-tã-tããã). Sei que é um cara que
conversará comigo, ele veste sua arrogância como uma camiseta engraçadinha, mas nele cai bem.
É o tipo de cara que age como alguém que transa muito, um cara que gosta de mulheres, um cara
que poderia me comer direito. Eu gostaria de ser comida direito! Minha vida sexual parece girar
em torno de três tipos de homens: riquinhos da Ivy League que acreditam ser personagens de um
romance de Fitzgerald; caras desonestos de Wall Street com cifrões nos olhos, ouvidos e bocas;
e garotos sensíveis e metidos a inteligentes que são tão convencidos que tudo parece uma piada.
Os do tipo Fitzgerald tendem a ser ineficientemente pornográficos na cama, muito barulho e
acrobacia com muito pouco resultado. Os caras do mercado financeiro ficam furiosos e flácidos.
Os metidos a inteligentes fodem como se estivessem compondo uma peça de math rock: esta mão
dedilha aqui, depois este dedo oferece uma bela linha de baixo... Estou parecendo meio vadia,
não é? Pausa enquanto calculo quantos... Onze. Nada mau. Sempre achei que uma dúzia fosse um
número redondo e razoável para encerrar a conta.
— Sério — continua o número doze. (Rá!) —, afaste-se da bandeja. James tem três outras
comidas na geladeira. Posso fazer uma azeitona com mostarda para você. Mas uma azeitona só.
Mas uma azeitona só. A frase é apenas um pouco engraçada, mas já tem o clima de uma
piada interna, que ficará mais engraçada com a repetição nostálgica. Penso: daqui a um ano,
estaremos caminhando pela ponte do Brooklyn ao pôr do sol e um de nós vai sussurrar “Mas
uma azeitona só”, e começaremos a rir. (Então eu me contenho. Se ele soubesse que eu já estava
pensando em daqui a um ano, sairia correndo e eu seria obrigada a encorajá-lo.)
Admito que sorrio principalmente porque ele é lindo. Lindo de deixar a pessoa distraída, o
tipo de aparência que faz seus olhos revirarem, que faz você querer mencionar o fato — “Você
sabe que é lindo, não sabe?” — e continuar com a conversa. Aposto que os homens o odeiam: ele
parece o vilão riquinho em um filme adolescente dos anos oitenta, aquele que atormenta o menino
diferente e sensível, aquele que acaba com uma torta na cara, o chantili escorrendo por sua gola
levantada enquanto todos na lanchonete aplaudem.
Mas ele não age assim. Seu nome é Nick. Adorei. Faz com que ele pareça legal, e comum, o
que ele é. Quando ele me diz seu nome eu falo: “Bem, esse é um nome de verdade.” Ele se
ilumina e manda mais uma: “Nick é o tipo de cara com quem você pode tomar uma cerveja, o
tipo de cara que não se importa se você vomitar no carro dele. Nick!”
Ele faz uma série de trocadilhos medonhos. Eu saco uns três quartos de suas referências
cinematográficas. Dois terços, talvez. (Nota mental: alugar Garota Sinal Verde .) Ele enche meu
copo novamente sem que eu tenha de pedir, conseguindo de algum jeito uma última dose da coisa
boa. Ele me reivindicou, colocou uma bandeira em mim: Cheguei aqui primeiro, ela é minha,
minha. Depois de minha recente série de homens pós-feministas nervosos e respeitosos, é legal
ser um território. Ele tem um grande sorriso, um sorriso de gato. Deveria tossir penas amarelas
de Piu-piu, do jeito que sorri para mim. Não pergunta o que eu faço da vida, o que é legal, para
variar. (Sou escritora, já mencionei isso?) Fala comigo em seu sotaque fluvial do Missouri;
nascido e criado na periferia de Hannibal, a cidade da infância de Mark Twain, que inspirou
Tom Sawyer. Ele me diz que quando adolescente trabalhou em um navio a vapor, jantar e jazz
para os turistas. E quando eu rio (menina mimada de Nova York que nunca se aventurou naqueles
grandes estados difíceis do Meio-Oeste, aqueles Estados Onde Muitas Outras Pessoas Vivem),
ele me informa que o Missoura é um lugar mágico, o mais lindo do mundo, não há nenhum estado
mais glorioso. Seu olhar é malicioso, seus cílios, compridos. Posso imaginar como ele era
quando criança.
Dividimos um táxi para casa, as luzes da rua criando sombras confusas e o carro acelerando
como se estivéssemos sendo perseguidos. É uma hora da manhã quando chegamos a um dos
inexplicáveis bloqueios de Nova York, a doze quarteirões do meu apartamento. Então saímos do
táxi para o frio, para o grande E Agora? E Nick começa a andar comigo em direção à minha casa,
sua mão na base das minhas costas, nosso rosto paralisado pelo frio. Quando viramos a esquina,
uma padaria está recebendo um carregamento de açúcar a granel, levando-o para o porão como
se fosse cimento, e não conseguimos ver nada além das silhuetas dos entregadores na nuvem
branca e doce. A rua está tomada, Nick me puxa para perto e abre aquele sorriso novamente,
pega um único cacho dos meus cabelos entre dois dedos e os desliza até a ponta, puxando duas
vezes, como se tocasse um sino. Seus cílios estão cobertos de açúcar, e antes de se inclinar ele
limpa o açúcar dos meus lábios para poder sentir meu gosto.
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Então resolvi criar esse blog porque, muita gente não tem dinheiro(tipo eu) ,vou postar livro de qualquer estilo,porque eu qualquer estilos amo ler,quer um livro que eu poste basta pedir na embaixo no meu ask,ok meu nome João Paulo ,comente para eu interagir com vocês.

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