sábado, 15 de agosto de 2015

AMY ELLIOTT DUNNE 23 DE AGOSTO DE 2010


ANOTAÇÃO EM DIÁRIO
Verão. Pássaros. Sol brilhando. Passei o dia andando pelo Prospect Park, minha pele
sensível, meus ossos frágeis. Lutando contra a infelicidade. É uma melhoria, já que passei os três
dias anteriores em nossa casa com o mesmo pijama sujo, contando as horas até as cinco, quando
poderia tomar um drinque. Tentando me fazer lembrar do sofrimento em Darfur. Colocar as
coisas em perspectiva. O que, acho, é apenas explorar ainda mais o povo de Darfur.
Tanta coisa aconteceu nessa última semana... Acho que é isso, tudo aconteceu de uma vez,
então estou com dores emocionais. Nick perdeu o emprego há um mês. Dizem que a recessão está
chegando ao fim, mas aparentemente ninguém sabe disso. Então Nick perdeu o emprego. Segunda
rodada de demissões, exatamente como ele previra — poucas semanas após a primeira. Opa, não
demitimos gente suficiente. Idiotas.
No começo, achei que Nick estivesse bem. Ele criou uma enorme lista de coisas que sempre
teve a intenção de fazer. Algumas eram pequenas: trocou as baterias e acertou os relógios,
substituiu um cano embaixo da nossa pia e pintou novamente todos os cômodos que pintamos
antes e não gostamos. Basicamente, ele refez várias coisas. É legal poder refazer as coisas, já
que temos tão poucas oportunidades como essa na vida. E depois ele começou com coisas
maiores: leu Guerra e paz. Flertou com a ideia de ter aulas de árabe. Passou muito tempo
tentando adivinhar quais habilidades serão necessárias nas próximas décadas. Isso partia meu
coração, mas eu fingia que não, pelo bem dele.
Eu ficava perguntando: “Tem certeza de que você está bem?”
No começo tentei seriamente, com café, contato visual, minha mão na dele. Depois tentei com
leveza, descontraidamente, de passagem. Depois tentei ternamente, na cama, acariciando seu
cabelo.
Ele tinha sempre a mesma resposta: “Estou legal. Não estou muito a fim de conversar sobre
isso.”
Eu escrevi um teste perfeito para o momento: “Como Você Está Lidando com sua
Demissão?”
a) Fico sentado, de pijama, e tomo muito sorvete — ressentimento é terapêutico!
b) Escrevo coisas cruéis sobre meu antigo chefe na internet, em toda parte — desabafar é ótimo!
c) Até aparecer um novo emprego, tento descobrir coisas úteis para fazer com meu novo tempo livre, como aprender um
idioma útil ou finalmente ler Guerra e paz.
Era um elogio a Nick — C era a resposta certa —, mas ele apenas deu um sorriso amargo
quando mostrei.
Depois de algumas semanas, a agitação chegou ao fim, as coisas úteis sumiram, como se ele
tivesse acordado certa manhã sob uma decrépita placa empoeirada que dizia: “Por que se dar o
trabalho, cacete?” Ficou com o olhar desinteressado. Agora vê TV, procura pornografia na
internet, assiste à pornografia na TV. Pede muita comida em casa, as embalagens empilhadas ao
lado da lata de lixo transbordando. Não fala comigo, se comporta como se o ato de falar fosse
fisicamente doloroso e eu fosse uma mulher maldosa por pedir isso a ele.
Mal dá de ombros quando conto que fui demitida.
Semana passada.
“É terrível, lamento”, diz. “Pelo menos você tem seu dinheiro para usar.”
“Nós temos o dinheiro. E eu gostava do meu trabalho.”
Ele começa a cantar “You Can’t Always Get What You Want”, desafinado, agudo, com uma
pequena dança trôpega, e percebo que está bêbado. É final de tarde, um belo dia de céu azul-azul,
e nossa casa está úmida, densa com o cheiro doce de comida chinesa apodrecendo, todas as
cortinas fechadas, e começo a ir de um cômodo a outro para arejar, abrindo as cortinas,
assustando as partículas de poeira, e quando chego ao escritório escuro tropeço em uma bolsa no
chão, e depois outra, e mais outra, como o gato do desenho animado que entra em uma sala cheia
de ratoeiras. Quando acendo a luz, vejo dezenas de sacolas de compras, e são de lugares aonde
pessoas que foram demitidas não vão. São as lojas masculinas caras, os lugares com ternos sob
medida, onde vendedores carregam gravatas individualmente pousadas sobre um braço para
clientes aninhados em poltronas de couro. Quer dizer, a merda é sob medida.
“O que é tudo isso, Nick?”
“Para entrevistas de emprego. Se alguém um dia voltar a contratar pessoas.”
“Você precisava de tanto?”
“Nós temos o dinheiro.” Ele sorri para mim sombriamente, os braços cruzados.
“Você não quer pelo menos pendurar?” Várias das capas plásticas foram mastigadas por
Bleecker. Um pequeno monte de vômito de gato está perto de um terno de três mil dólares; uma
camisa branca feita sob medida está coberta de pelos laranja onde o gato tirou um cochilo.
“Na verdade não, não quero”, diz ele. E sorri sombriamente para mim.
Eu nunca fui uma megera, sempre me orgulhei de minha não megerice. Então me deixa furiosa
que Nick esteja me obrigando a ser megera. Estou disposta a viver com alguma dose de descuido,
de desleixo, de vida preguiçosa. Sei que sou mais tipo A do que Nick e tento tomar cuidado para
não infligir minha natureza obsessiva com arrumação e com listas de tarefa a ele. Nick não é o
tipo de cara que pensa em passar aspirador ou limpar a geladeira. Ele realmente não vê esse tipo
de coisa. Tudo bem. Mesmo. Mas eu gosto de um certo padrão de vida — acho que é justo dizer
que a lixeira não deve literalmente transbordar, e os pratos não devem passar uma semana na pia
com burrito de feijão seco grudado. Isso é simplesmente ser um companheiro bom e adulto. E
Nick não está mais fazendo nada, então tenho de reclamar como uma megera, e isso me deixa
furiosa: Você está me transformando no que eu nunca fui e nunca quis ser, uma megera,
porque não está cumprindo sua parte em um acordo muito simples. Não faça isso, não é certo
fazer isso.
Eu sei, eu sei, eu sei que perder o emprego é incrivelmente estressante, em especial para um
homem, dizem que pode ser como uma morte na família, em particular para um homem como
Nick, que sempre trabalhou, então eu dou uma respirada gigantesca, enrolo minha raiva fazendo
uma bola de borracha vermelha e mentalmente a chuto para o espaço. “Bem, você se importa se
eu pendurar as roupas? Só para que fiquem em bom estado para você?”
“Vai fundo.”
Demissão em casal, não é fofo? Sei que temos mais sorte do que a maioria: eu entro na
internet e confiro o pecúlio sempre que fico nervosa. Nunca chamei de pecúlio antes de Nick
fazê-lo; na verdade não é tão grandioso. Quer dizer, é legal, é ótimo — 785.404 dólares que eu
tenho de economias graças a meus pais. Mas não é o tipo de dinheiro que permite que você nunca
mais trabalhe, especialmente em Nova York. O objetivo dos meus pais era me deixar
financeiramente segura para não precisar fazer escolhas com base em dinheiro — no estudo, na
carreira —, mas não tão segura que sentisse a tentação de sacar tudo. Nick debocha, mas acho
que é um grande gesto da parte dos meus pais. (E adequado, considerando que eles plagiaram
minha infância para os livros.)
Mas ainda estou furiosa com a demissão, nossas demissões, quando meu pai telefona e
pergunta se ele e mamãe podem dar uma passada. Precisam conversar conosco. Esta tarde, na
verdade agora, se não for problema. Claro que não é problema, digo, e em minha cabeça fico
pensando Câncer, câncer, câncer.
Meus pais surgem à porta com uma aparência muito arrumada. Meu pai está totalmente
passado, camisa para dentro da calça, sapatos engraxados, impecável, a não ser pelas olheiras.
Minha mãe usa um de seus vestidos roxo-brilhantes que sempre colocava para discursos e
cerimônias quando recebia esses convites. Ela diz que a cor exige confiança da parte de quem
veste.
Eles estão com ótima aparência, mas envergonhados. Eu os levo até o sofá, e todos ficamos
sentados em silêncio por um segundo.
“Meninos, sua mãe e eu, parece que nós...”, meu pai finalmente começa, depois para e tosse.
Coloca as mãos nos joelhos; seus grandes nós dos dedos estão brancos. “Bem, aparentemente nos
metemos em uma confusão financeira infernal.”
Não sei qual deveria ser minha reação: chocada, consoladora, desapontada? Meus pais nunca
me confessaram nenhum tipo de problema. Acho que não tiveram muitos problemas.
“O fato é o seguinte: fomos irresponsáveis”, continua Marybeth. “Vivemos a década passada
como se estivéssemos ganhando o mesmo dinheiro que ganhamos nas duas décadas anteriores, e
não estávamos. Não ganhamos nem metade, mas estávamos em negação. Fomos... otimistas talvez
seja uma forma gentil de definir. Ficamos achando que o livro seguinte da série Amy resolveria,
mas isso não aconteceu. E tomamos várias decisões ruins. Investimos tolamente. Gastamos
tolamente. E agora...”
“Estamos basicamente falidos”, diz Rand. “Nossa casa, bem como esta casa... está tudo
naufragando.”
Eu achara até então — supusera — que eles haviam simplesmente comprado a casa para nós.
Não tinha ideia de que ainda estavam pagando prestações. Eu sinto uma pontada de
constrangimento por ser tão protegida quanto Nick diz que sou.
“Como disse, cometemos alguns erros graves de avaliação”, diz Marybeth. “Deveríamos
escrever um livro: Amy Exemplar e a hipoteca com juros variáveis. Seríamos reprovados em
todos os testes. Seríamos o primeiro exemplo a não seguir. A amiga de Amy, Wendy Quer
Agora.”
“Harry Cabeça Enfiada na Areia”, acrescenta Rand.
“O que acontece agora?”, pergunto.
“Isso depende totalmente de vocês”, diz meu pai.
Minha mãe tira da bolsa um folheto feito em casa e o coloca na mesa diante de nós — barras,
gráficos e tabelas criados no computador. Dói imaginar meus pais estudando o manual, tentando
fazer sua proposta ficar bonita para mim.
Marybeth começa:
“Queríamos perguntar se poderíamos pegar algum dinheiro emprestado de seu pecúlio
enquanto resolvemos o que fazer com o restante de nossa vida.”
Meus pais ficam sentados diante de nós como dois universitários ansiosos por obter seu
primeiro estágio. O joelho de meu pai sacode até minha mãe colocar um dedo gentil sobre ele.
“Bem, o pecúlio é dinheiro de vocês, então claro que podem pegar emprestado”, digo. Eu só
quero que aquilo termine; o olhar esperançoso no rosto de meus pais, não dá para aguentar. “De
quanto acham que precisam para quitar tudo e ficarem confortáveis por algum tempo?”
Meu pai olha para os sapatos. Minha mãe respira fundo.
“Seiscentos e cinquenta mil”, diz ela.
“Ah.”
É tudo o que consigo dizer. É quase tudo o que temos.
“Amy, talvez você e eu devamos conversar”, começa Nick.
“Não, não, podemos fazer isso”, digo. “Vou pegar meu talão de cheques.”
“Na verdade”, diz Marybeth, “se você pudesse transferir para nossa conta amanhã seria
melhor. Do contrário a compensação demora dez dias.”
É aí que eu sei que eles estão com problemas graves.
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Então resolvi criar esse blog porque, muita gente não tem dinheiro(tipo eu) ,vou postar livro de qualquer estilo,porque eu qualquer estilos amo ler,quer um livro que eu poste basta pedir na embaixo no meu ask,ok meu nome João Paulo ,comente para eu interagir com vocês.

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