terça-feira, 18 de agosto de 2015

AMY ELLIOTT DUNNE DEZ DIAS SUMIDA


Tomei uma decisão: dar um telefonema. O encontro não podia acontecer antes daquela noite
— há complicações previsíveis —, então passo o dia me arrumando e me preparando.
Eu me limpo no banheiro de um McDonald’s — gel verde em toalhas de papel molhadas — e
coloco um vestido de verão barato. Penso no que direi. Estou surpreendentemente ansiosa. A
vida no buraco estava me cansando: a máquina de lavar comunitária com a roupa íntima molhada
de alguém sempre presa no varal no alto, para ser retirada por dedos em pinça reticentes; o canto
do carpete do meu chalé que sempre estava misteriosamente úmido; a torneira pingando no
banheiro.
Às cinco horas, começo a dirigir rumo ao norte até o local do encontro, um cassino à beira do
rio chamado Horseshoe Alley. Ele surge do nada, um calombo em néon piscando no meio de uma
floresta escassa. Usando o pouco de gasolina que me resta, estaciono o carro e analiso a
paisagem: uma migração de idosos, avançando rapidamente com andadores e bengalas como
insetos tristes, arrastando cilindros de oxigênio na direção das luzes brilhantes. Entrando e
saindo dos grupos de octogenários estão garotos apressados e arrumados demais que viram
filmes demais sobre Vegas e não sabem como são deprimentes, tentando imitar a turma do Rat
Pack com ternos baratos nas florestas do Missouri.
Entro abaixo de um cartaz reluzente promovendo — por apenas duas noites — o reencontro
de um grupo de doo-wop dos anos cinquenta. Do lado de dentro, o cassino é gelado e apertado.
Os caça-níqueis fazem clinc e clang, alegres trinados eletrônicos que não combinam com os
rostos embotados e caídos das pessoas sentadas à frente deles, fumando cigarros acima de
máscaras de oxigênio penduradas. Colocando moeda, colocando moeda, colocando moeda,
colocando moeda, colocando moeda, ding-ding-ding!, colocando moeda, colocando moeda. O
dinheiro que eles desperdiçam vai para escolas públicas frequentadas por seus netos entediados
e sonolentos. Colocando moeda, colocando moeda. Um grupo de rapazes embriagados passa,
uma despedida de solteiro, os lábios dos rapazes molhados de álcool; eles nem sequer percebem
minha presença, com suas vozes roucas e cabelos cortados rente. Estão falando sobre garotas,
arrume umas gatas, mas, além de mim, as únicas gatas que vejo são as Supergatas. Os garotos
beberão até afogar a decepção e depois tentarão não matar outros motoristas no caminho de volta
para casa.
Espero em um barzinho na extrema esquerda da entrada do cassino, como planejado, e vejo a
boy band envelhecida se apresentar para uma grande plateia de cabelos de algodão que canta
junto e bate palmas, enfiando dedos encarquilhados em tigelas de amendoim de cortesia. Os
cantores esqueléticos, enrugados sob smokings ofuscantes, giram lentamente, com cuidado, sobre
próteses de quadril, a dança dos moribundos.
Inicialmente o cassino parecera uma boa ideia — perto da rodovia, cheio de bêbados e
idosos, que não são conhecidos pela visão boa. Mas estou me sentindo oprimida e agitada,
consciente das câmeras em todos os cantos, as portas que podem ser trancadas em um segundo.
Estou prestes a sair quando ele entra descontraidamente.
— Amy.
* * *
Chamei o dedicado Desi para me ajudar (e ser meu cúmplice). Desi, com quem nunca perdi
realmente o contato, e que — a despeito do que disse a Nick e meus pais — não me assusta nem
um pouco. Desi, outro homem à beira do Mississippi. Sempre soube que ele poderia ser útil. É
bom ter pelo menos um homem que você pode usar para qualquer coisa. Desi é uma espécie de
cavaleiro branco. Adora mulheres problemáticas. Ao longo dos anos, após Wickshire, quando
conversávamos, eu perguntava sobre sua última namorada, e não importava qual fosse a garota,
ele sempre dizia: “Ah, ela não anda muito bem, infelizmente.” Mas sei que Desi gosta disso — os
distúrbios alimentares, os vícios em analgésicos, as depressões incapacitantes. Ele nunca é mais
feliz do que quando está junto a um leito. Não na cama, apenas instalado ali por perto com uma
sopa, um suco e uma voz gentilmente engomada. Pobrezinha.
Agora ele está aqui, elegante em um terno branco de meados de verão (Desi troca o guardaroupa
mensalmente — o que era adequado para junho não funciona em julho —, e sempre
admirei a disciplina, a precisão do vestir dos Collings). Ele está com boa aparência. Eu não.
Tenho plena consciência de meus óculos embaçados, do excesso de carne na minha cintura.
— Amy.
Ele toca minha bochecha, depois me puxa para um enlace. Não um abraço, Desi não abraça, é
mais como ser envolvida por algo feito sob medida para você.
— Querida. Você não imagina. Aquele telefonema. Achei que havia enlouquecido. Achei que
eu estava inventando! Eu havia sonhado acordado com isso, que de algum modo você estava
viva, e então. Aquele telefonema. Você está bem?
— Agora estou — respondo. — Agora me sinto segura. Tem sido horrível.
E então caio em prantos, o que não estava nos planos, mas as lágrimas são um grande alívio,
e combinam de forma tão perfeita com o momento que me permito desmoronar totalmente. O
estresse pinga para fora de mim: a coragem de colocar o plano em ação, o medo de ser pega, a
perda do meu dinheiro, a traição, os maus-tratos, a simples brutalidade de estar por conta própria
pela primeira vez na vida.
Fico bem bonita após chorar um pouco — mais que isso e o nariz começa a escorrer, o
inchaço se instala no rosto todo, mas até esse ponto meus lábios ficam mais cheios, os olhos
maiores, as bochechas coradas. Conto enquanto choro no ombro engomado de Desi: um
Mississippi, dois Mississippi — aquele rio novamente — e freio as lágrimas depois de um
minuto e quarenta e oito segundos.
— Desculpe não ter conseguido chegar aqui antes, querida — diz Desi.
— Sei como Jacqueline mantém sua agenda cheia — hesito.
A mãe de Desi é um assunto delicado em nossa relação.
Ele me analisa.
— Você está muito... diferente. Tão cheia no rosto, especialmente. E seu pobre cabelo está...
— começa, e se contém. — Amy. Nunca pensei que poderia ser tão grato por algo. Conte o que
aconteceu.
Conto uma história gótica de possessividade e fúria, de brutalidade básica do Meio-Oeste, de
machismo e domínio animal. De estupro, comprimidos, álcool e punhos. Botas pontudas de
caubói nas costelas, medo e traição, apatia paterna, isolamento e as últimas palavras reveladoras
de Nick: “Você não pode me deixar nunca. Eu mato você. Eu encontro você não importa o que
aconteça. Você é minha.”
Sobre como tive de desaparecer pela minha própria segurança e a de meu filho ainda por
nascer, e de como precisava da ajuda de Desi. Meu salvador. Minha história satisfaria a ânsia de
Desi por mulheres arruinadas — naquele momento eu era a mais arrasada delas. Há muito tempo,
no internato, eu contara a ele sobre as visitas noturnas de meu pai ao meu quarto, eu em uma
camisola rosa com babados olhando para o teto até que ele terminasse. Desi me amou desde essa
mentira, sei que ele se imagina fazendo amor comigo, como seria gentil e tranquilizador enquanto
mergulha em mim, acariciando meus cabelos. Sei que me imagina chorando suavemente enquanto
me entrego a ele.
— Nunca vou poder voltar para minha antiga vida, Desi. Nick irá me matar. Nunca me
sentirei segura. Mas não posso deixar que ele vá para a prisão. Eu só queria desaparecer. Não
me dei conta de que a polícia acharia que foi ele.
Olho novamente na direção da banda no palco, onde um septuagenário esquelético está
cantando sobre o amor. Perto de nossa mesa, um sujeito de costas retas com um bigode bem
cuidado joga seu copo na direção de uma lata de lixo perto de nós e acerta de tabela (uma
expressão que aprendi com Nick). Gostaria de ter escolhido um lugar mais pitoresco. E agora o
cara está olhando para mim, inclinando a cabeça, em confusão exagerada. Se ele fosse um
desenho animado, coçaria a cabeça, que faria um som de rangido de nhec-nhec. Por alguma
razão, penso: ele parece um policial. Dou as costas para ele.
— Nick é a última coisa com que você deve se preocupar — fala Desi. — Entregue essa
preocupação para mim e cuidarei dela.
Ele estende a mão, um antigo gesto. Ele é meu guardião de preocupações; é um jogo ritual que
fazíamos quando adolescentes. Finjo colocar algo na palma da mão dele, ele fecha os dedos
sobre a coisa e eu realmente me sinto melhor.
— Não, não vou cuidar dela. Espero que Nick morra pelo que fez a você — diz ele. — Em
uma sociedade sã, ele morreria.
— Bem, estamos em uma sociedade insana, então preciso permanecer escondida. Acha que
isso é horrível de minha parte? — pergunto, já sabendo a resposta.
— Querida, claro que não. Você está fazendo o que foi obrigada a fazer. Seria loucura agir
de qualquer outra forma.
Ele não pergunta nada sobre a gravidez. Sabia que não perguntaria.
— Você é o único que sabe — informo.
— Vou cuidar de você. O que posso fazer?
Finjo vacilar, mordo a beirada do lábio, desvio os olhos, e depois olho para Desi novamente.
— Preciso de dinheiro para sobreviver por um tempo. Pensei em arrumar um emprego, mas...
— Ah, não, não faça isso. Você está em toda parte, Amy, em todos os noticiários, todas as
revistas. Alguém a reconheceria. Mesmo com este novo corte de cabelo... esportivo — diz,
tocando meus fios. — Você é uma mulher linda, e é difícil para uma mulher linda desaparecer.
— Infelizmente acho que você está certo — concordo. — Só não quero que você pense que
estou me aproveitando. Apenas não sei para onde mais ir...
A garçonete, uma morena sem graça disfarçada de morena bonita, aparece, coloca nossas
bebidas na mesa. Desvio o rosto e vejo que o bigodudo curioso está de pé um pouco mais perto,
observando-me com um meio sorriso. Estou sem prática. A Antiga Amy nunca teria vindo aqui.
Minha mente apodreceu com Coca-Cola diet e o cheiro do meu próprio corpo.
— Pedi um gim-tônica para você — digo.
Desi faz uma careta delicada.
— O que houve? — pergunto, mas já sei.
— Esse é meu drinque de primavera. Agora vou de Jack e gingers.
— Então vamos pedir um desses, e eu fico com seu gim.
— Não, tudo bem, não se preocupe.
O enxerido aparece novamente em minha visão periférica.
— Aquele cara, aquele cara de bigode... Não olhe agora... Ele está me encarando?
Desi dá uma espiada, nega com um aceno de cabeça.
— Ele está olhando para os... cantores — diz a palavra duvidosamente. — Você não precisa
apenas de um pouco de dinheiro. Você vai ficar cansada de se esconder assim. De não poder
olhar diretamente para ninguém. Viver entre... — diz, abrindo os braços para abranger todo o
cassino — pessoas com as quais imagino que não tenha nada em comum. Viver abaixo de seus
recursos.
— Vai ser assim pelos próximos dez anos. Até que eu tenha envelhecido o bastante, que a
história tenha sido esquecida e que eu possa me sentir à vontade.
— Rá! Você está disposta a fazer isso por dez anos? Amy?
— Shhh, não diga o nome.
— Cathy, Jenny, Megan, sei lá o quê, não seja ridícula.
A garçonete retorna, Desi dá a ela uma nota de vinte e a dispensa. Ela sai sorrindo. Erguendo
a nota de vinte como se fosse algo fora do comum. Tomo um gole do meu drinque. O bebê não
vai se importar.
— Não acho que Nick prestaria queixa caso você retornasse — diz Desi.
— O quê?
— Ele me procurou. Acho que sabe que a culpa é dele...
— Ele procurou você? Quando?
— Semana passada. Antes de eu falar com você, graças a Deus.
Nick demonstrou mais interesse em mim nos últimos dez dias do que nos últimos anos.
Sempre quis que um homem se metesse em uma briga por mim — uma briga brutal, sanguinolenta.
Nick indo interrogar Desi é um bom começo.
— O que ele disse? Como parecia?
— Parecia um completo babaca. Quis colocar a culpa em mim. Contou uma história maluca
sobre como eu...
Sempre gostei daquela mentira sobre Desi tentando se matar por minha causa. Ele ficara
realmente devastado com o término do nosso namoro, e ficara muito chato, assustador, circulando
pelo campus, esperando que eu o aceitasse de volta. Então poderia muito bem ter tentado
suicídio.
— O que Nick disse sobre mim?
— Acho que ele sabe que não pode machucá-la agora que o mundo sabe quem você é e se
preocupa. Ele teria que deixar você voltar em segurança, e você poderia se divorciar dele e
casar com o homem certo — diz, tomando um gole. — Finalmente.
— Não posso voltar, Desi. Mesmo se as pessoas acreditassem nos maus-tratos de Nick. Eu
ainda seria a pessoa odiada, fui eu quem os enganou. Eu seria a maior pária do mundo.
— Você seria minha pária, e eu a amaria não importa o que acontecesse, e a protegeria de
tudo — afirma Desi. — Você nunca teria de lidar com nada disso.
— Nós nunca mais iríamos poder socializar com ninguém.
— Poderíamos deixar o país se você quisesse. Viver na Espanha, na Itália, onde quiser,
passar nossos dias comendo mangas ao sol. Dormir até tarde, jogar Palavras Cruzadas, folhear
livros despreocupadamente, nadar no mar.
— E quando eu morresse, seria uma bizarra nota de rodapé, uma aberração. Não. Orgulho eu
tenho, Desi.
— Não vou deixar você voltar para a vida de estacionamento de trailers. Venha comigo, eu
instalo você na casa do lago. É bem isolada. Levo mantimentos e tudo de que precisar, a qualquer
momento. Você pode se esconder lá, totalmente só, até decidirmos o que fazer.
A casa no lago de Desi era uma mansão, e levar mantimentos era se tornar meu amante.
Podia sentir a necessidade exalando dele como calor. Ele estava se contorcendo um pouco dentro
do terno, querendo fazer aquilo acontecer. Desi era um colecionador. Tinha quatro carros, três
casas, suítes cheias de ternos e sapatos. Gostaria de saber que eu estava guardada sob uma
redoma. A maior fantasia do cavaleiro branco: tirar a princesa agredida de sua situação difícil e
colocá-la sob sua proteção dourada em um castelo onde ninguém além dele pode entrar.
— Não posso fazer isso. E se a polícia de algum modo descobrir e fizer uma busca?
— Amy, a polícia acha que você está morta.
— Não, devo ficar sozinha por enquanto. Você pode me dar só algum dinheiro?
— E se eu disser não?
— Então saberei que sua oferta de me ajudar não era sincera. Que você é como Nick e que
quer apenas me controlar, do modo que for possível.
Desi fica em silêncio, engolindo seu drinque com o maxilar trincado.
— É uma coisa bastante monstruosa de dizer.
— É uma forma bastante monstruosa de agir.
— Não estou agindo assim. Estou preocupado com você. Tente a casa do lago. Caso se sinta
oprimida por mim, caso se sinta desconfortável, vá embora. O pior que pode acontecer é você ter
alguns dias de descanso e descontração.
O bigodudo de repente está à nossa mesa, um sorriso incerto no rosto.
— Madame, você não teria parentesco com a família Enloe, teria? — pergunta.
— Não — respondo, e viro o rosto.
— Desculpe, é que você parece...
— Somos do Canadá, agora com licença — corta Desi, e o sujeito revira os olhos, murmura
um caramba e caminha de volta para o bar. Mas continua a olhar para mim.
— É melhor irmos embora — sugere Desi. — Venha para a casa do lago. Eu a levo para lá
agora.
Ele se levanta.
A casa no lago de Desi teria uma cozinha enorme, teria salas pelas quais eu poderia passear
— poderia dar uma de noviça rebelde, rodopiando nelas, de tão enormes que seriam. A casa
teria wi-fi e TV a cabo para todas as minhas necessidades de centro de comando, uma banheira
de cair o queixo, roupões felpudos e uma cama que não ameaçava desabar.
Também teria Desi, mas Desi podia ser administrado.
No bar, o cara continua me encarando, com menos simpatia.
Eu me curvo e beijo Desi de leve nos lábios. Tem de parecer que a decisão foi minha.
— Você é um homem maravilhoso. Lamento colocar você nessa situação.
— Quero estar nessa situação, Amy.
* * *
Estamos saindo, passando por um bar particularmente deprimente, TVs zumbindo em todos os
cantos, quando eu vejo a Vagabunda.
A Vagabunda está dando uma coletiva.
Andie parece pequena e inofensiva. Parece uma babá, e não uma babá sensual de filme pornô,
mas a garota que mora na sua rua, aquela que brinca de verdade com as crianças. Eu sei que essa
não é a Andie real, porque eu a segui na vida real. Na vida real ela veste tops diminutos para
exibir os seios e jeans justos, e tem cabelos compridos e ondulados. Na vida real ela parece
comível.
Agora ela está com um vestido de botões pregueado com os cabelos atrás das orelhas, e
parece ter chorado, dá para ver pelo leve inchaço rosado sob os olhos. Parece exausta e nervosa,
mas muito bonita. Mais bonita do que eu pensara antes. Eu nunca a vira tão de perto. Ela tem
sardas.
— Ahhh, merda — xinga uma mulher para a amiga, uma ruiva-cabernet barato.
— Ah, nãããão, logo quando eu estava começando a sentir pena do cara — diz a amiga.
— Tenho coisas na minha geladeira mais velhas que essa garota. Que babaca.
Andie está de pé atrás do microfone e olha com cílios negros para uma declaração que treme
em sua mão. Seu lábio superior está úmido; ele brilha sob as luzes das câmeras. Ela passa um
indicador para eliminar o suor.
— Hã. Minha declaração é a seguinte: tive um caso com Nick Dunne de abril de 2011 até
julho deste ano, quando sua esposa, Amy Dunne, desapareceu. Nick era meu professor na
faculdade de North Carthage, viramos amigos e depois a relação se tornou algo mais.
Andie para e pigarreia. Uma mulher de cabelos escuros atrás dela, não muito mais velha que
eu, estende um copo de água, que ela toma rapidamente, o copo tremendo.
— Estou profundamente envergonhada de ter me envolvido com um homem casado. Isso vai
contra todos os meus valores. Eu realmente acreditava estar apaixonada — começa a chorar, a
voz falhando — e que Nick Dunne estava apaixonado por mim. Ele me disse que sua relação com
a esposa chegara ao fim e que iriam se divorciar em breve. Eu não sabia que Amy Dunne estava
grávida. Estou colaborando com a polícia na investigação do desaparecimento de Amy Dunne e
farei tudo o que estiver ao meu alcance para ajudar.
Sua voz é miúda, infantil. Ela ergue os olhos para o muro de câmeras diante de si, parece
chocada, e os baixa novamente. Duas maçãs ficam vermelhas em suas bochechas redondas.
— Eu... Eu...
Ela começa a soluçar, e sua mãe — aquela mulher tem de ser a mãe dela, ambas têm os
mesmos olhos exageradamente grandes de desenho japonês — coloca um braço sobre seu ombro.
Andie continua a ler.
— Lamento muito e estou envergonhada pelo que fiz. E quero me desculpar com a família de
Amy por qualquer papel que possa ter tido em sua dor. Estou colaborando com a polícia na
investigação... Ah, já disse isso.
Ela dá um pequeno sorriso constrangido, e a imprensa dá risinhos de encorajamento.
— Pobre coisinha — diz a ruiva.
Ela é uma vagabundazinha, não merece pena. Não consigo acreditar que alguém possa
sentir pena de Andie. Literalmente me recuso a acreditar.
— Sou uma estudante de vinte e três anos — continua. — Só peço um pouco de privacidade
para me recuperar durante este momento muito doloroso.
— Boa sorte com isso — murmuro enquanto Andie recua e um policial se recusa a responder
a perguntas, e todos saem da imagem. Eu me pego me inclinando para a esquerda como se
pudesse segui-los.
— Coitadinha dessa menina — diz a mulher mais velha. — Parecia aterrorizada.
— Acho que ele é culpado mesmo, no fim das contas.
— Ele passou mais de um ano com ela.
— Cretino.
Desi me cutuca de leve e arregala os olhos em uma pergunta: eu sabia sobre o caso? Eu estou
bem? Meu rosto é uma máscara de fúria — coitadinha dessa menina o cacete —, mas posso
fingir que é por causa dessa traição. Confirmo com um gesto de cabeça, dou um sorriso fraco.
Estou bem. Estamos prestes a sair quando vejo meus pais, de mãos dadas como sempre, indo
juntos até o microfone. Minha mãe parece ter cortado os cabelos recentemente. Me pergunto se eu
deveria me aborrecer por ela ter feito uma pausa no meio do meu desaparecimento para cuidar
do visual. Quando alguém morre e os parentes seguem em frente você sempre os ouve dizer
fulano teria querido que fosse assim. Eu não quero que seja assim.
Minha mãe fala:
— Nossa declaração será breve, e não responderemos a perguntas depois. Primeiramente,
obrigado a vocês pela tremenda efusão pela nossa família. Parece que o mundo ama Amy tanto
quanto nós. Amy: sentimos falta de sua voz calorosa e de seu bom humor, sua perspicácia e seu
bom coração; você é maravilhosa. Nós traremos você de volta para nossa família. Sei que
traremos. Em segundo lugar, não sabíamos até esta manhã que nosso genro, Nick Dunne, estava
tendo um caso. Desde o começo deste pesadelo, ele tem estado menos envolvido, menos
interessado, menos preocupado do que deveria. Dando a ele o benefício da dúvida, atribuímos
esse comportamento ao choque. Com nossa descoberta, já não pensamos assim. Dessa forma,
retiramos nosso apoio a Nick. Enquanto avançamos com a investigação, só podemos esperar que
Amy volte para nós. Sua história deve continuar. O mundo está pronto para um novo capítulo.
Amém, diz alguém.
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Bem Vindos ao Livro teen


Então resolvi criar esse blog porque, muita gente não tem dinheiro(tipo eu) ,vou postar livro de qualquer estilo,porque eu qualquer estilos amo ler,quer um livro que eu poste basta pedir na embaixo no meu ask,ok meu nome João Paulo ,comente para eu interagir com vocês.

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